O Estrangeiro

O advogado de acusação declarou aos jurados que a testemunha exercia uma profissão mais duvidosa. Eu era seu cúmplice e amigo, tratava-se de um drama, pelo fato de estarmos diante de um monstro moral.

Raimundo quis defender-se, e o meu advogado protestou, mas disseram-lhe que deixasse o procurador acabar o que estava a dizer. Este disse pouco, tenho que acrescentar ao acusado – perguntou Raimundo – sim – respondeu este – era meu amigo – o advogado de acusação fez-me então a mesma pergunta e eu olhei para Raimundo, que não desviou os olhos. Respondi:

Sim.

O procurador voltou-se então para o júri e declarou: - O mesmo homem um dia depois de a mãe ter morrido, se entregava a mais vergonhosa devassidão. Matou por motivos fúteis e para liquidar um inqualificável caso crapuloso.

Mas o meu advogado gritou levantando os braços de tal forma que as mangas iam caindo para trás, as pregas de uma camisa engomada. Enfim estão a acusando ter assassinado um homem ou de ter morrido a mãe?

O publico riu-se. O procurador levantou-se outra vez ajustou a toga e declarou que era preciso ter a ingenuidade do ilustre defensor.

Para não sentir que entre as duas ordens de fato havia uma relação patética essencial – sim – exclamou ele com força – acuso este homem de ter assistido ao enterro da mãe com um coração de criminoso.

Esta declaração parece ter provocado um efeito considerável sobre o júri, e sobre o público. O meu advogado encolheu os ombros e limpou o suor que lhe escorria à testa, parecia abalado e compreendia nesta altura que as coisas não estavam muito bem, para mim, mas tudo se…